História Livro
Livro resgata a história de um dos mais emblemáticos locais de encontro da cidade de São Paulo, o Ponto Chic
Inaugurado em 1922, no Largo do Paissandu, em plena ebulição artística e social da cidade, o Ponto Chic se tornou um dos destinos mais famosos de São Paulo. Sua trajetória se mistura com a história da cidade e acompanhou sua evolução. Para mostrar esse percurso, a Editora Senac São Paulo publica Ponto Chic - um bar na história de São Paulo, de autoria do jornalista Angelo Iacocca.
A ideia da obra surgiu quando José Carlos Alves de Souza, proprietário do estabelecimento, observava seus filhos discutirem fatos históricos de São Paulo. “Notei a falta de conhecimento que existe entre os jovens sobre o lugar em que vivem. Naquele momento, cresceu a vontade de fazer uma homenagem à cidade, contando também a origem do Ponto Chic”, relata Alves. Foi então que convidou o jornalista Angelo Iacocca para dar corpo ao projeto. Iacocca peneirou documentos históricos, vasculhou curiosidades e colheu depoimentos de antigos frequentadores, artistas, políticos, jornalistas e escritores.
Com apresentação de Ignácio de Loyola Brandão, também um grande apreciador do bar, o título traça os principais momentos do desenvolvimento de São Paulo, seus movimentos políticos e artísticos, além da transformação de uma pacata cidade provinciana em uma das maiores metrópoles do mundo. A obra tem início com um breve panorama do começo do século XX, concentrando-se, nos capítulos seguintes, nas décadas de 1920 a 1960. Passa também pela decadência do centro, em 1970, e pelas mudanças urbanas sofridas desde então.
Nos capítulos finais, Iacocca relata como a degradação gradual do centro de São Paulo, a partir de 1970, levou ao fechamento do Ponto Chic. O autor conta a tristeza de muitos funcionários, que chegaram a destruir parte das instalações. Mostra ainda como o estabelecimento ressurgiu, já nas mãos dos atuais donos, em 1978, no bairro de Perdizes, para posteriormente reabrir no Paissandu novamente, no mesmo número onde surgiu em 1922.Para complementar a obra, o livro traz também as clássicas receitas do local, entre elas o bauru, o mexidinho, o sanduíche rococó (com gorgonzola), a fritada e o pudim.
Entrevista de Angelo Iacocca ao Jô Soares
Agito cultural e gastronômico no Paissandu
Enquanto acontecia a Semana de Arte Moderna, em 1922, o italiano Odílio Cecchini abria um bar no coração da boemia paulistana. Sem nome na fachada, o local logo atraiu a elite e os intelectuais da cidade. Por conta da decoração, com azulejos franceses e balcão de mármore, passou a ser carinhosamente chamado de lugar chique até ser batizado oficialmente de Ponto Chic. “Convergiam para lá quase todos os integrantes do Movimento Modernista, em especial, Mario e Oswald de Andrade, Raul Bopp, assim como os antimodernistas, encabeçados por Monteiro Lobato”, revela Iacocca.
Ao longo do tempo, o bar foi palco de conspirações políticas e quintal dos estudantes do Largo São Francisco. Em suas mesas torcia-se pela Revolução Constitucionalista e mais tarde pela queda de Getúlio Vargas. Na década de 1940, atrairia também jogadores de futebol, como Leônidas, e jornalistas esportivos, entre eles Blota Júnior, além de contar, em primeira mão, com a edição de segunda-feira da Gazeta Esportiva – que estava disponível por lá antes mesmo de chegar às bancas. Na década de 1950, Adoniran Barbosa e os integrantes do grupo Demônios da Garoa eram presença constante nas mesas do Ponto Chic, onde costumavam saborear o popular bauru acompanhado por chope, além de cantarolar novas composições.
“O Ponto Chic foi a instituição mais democrática que conheci, igualava classes socais, promovia a solidariedade. Dia e noite, cheio, barulhento”, relembra Loyola Brandão.
Nascimento do bauru
A criação do sanduíche mais famoso da cidade mereceu muitas versões, e no livro, Angelo Iacocca apresenta todas elas, em depoimentos de antigos frequentadores, garçons e de parentes do estudante de Direito que criou o bauru: Casimiro Pinto Neto, conhecido pelo apelido de Bauru, por ter nascido nessa cidade do interior paulista. Foi numa noite de 1936, durante uma vigília dos estudantes, que Casimiro pediu ao chapeiro Carlos para montar um prato com pão francês, queijos derretidos, rosbife e tomate. A receita se transformou em coqueluche e até hoje é a principal atração do Ponto Chic. O pepino, que faz parte da versão atual do sanduíche, foi inserido só nos anos 1950.
Sobre o autor
Angelo Iacocca nasceu em San Marco dei Cavoti, pequena aldeia medieval do sul da Itália, e reside em São Paulo desde 1963. Formado em jornalismo, iniciou sua carreira em 1970 no jornal Gazeta Mercantil, onde permaneceu até 1977. Em seguida foi repórter no jornal semanal Aqui São Paulo, tablóide semanal editado por Samuel Wainer. Paralelamente, como crítico de música, foi colaborador em várias revistas, entre elas Isto É e Som Três. Entre 1991 e 1993, como curador de artes plásticas para o Lloyds Bank, foi responsável pela realização de exposições em São Paulo e Rio de Janeiro dos artistas plásticos José Antônio da Silva, Manabu Mabe, Arcangelo Ianelli e Claudio Tozzi.
Como autor, em 1994 escreveu Aos nossos momentos, livro autobiográfico de Giovanni Bruno, além de algumas biografias de empresários. Em 1998 publicou Conjunto Nacional – A conquista da Paulista (reeditado em 2004). Em 2012, lançou Retratos da imigração italiana no Brasil e Avenida Paulista 120 anos.